A liberdade da investigação científica e a fraternal convivência entre cientistas ─ independentemente dos sistemas políticos ou das convicções religiosas ─ são valores que todos os homens de ciência muito prezam.
Desde o último século, porém, razões políticas levaram a que grupos mais ou menos numerosos de cientistas boicotassem a actividade científica de outros grupos. O caso mais conhecido é, talvez, o isolamento a que foram forçadamente sujeitos os intelectuais alemães e austríacos após a 1ª Guerra Mundial. Teve igualmente algum impacto, o boicote científico realizado contra a África do Sul, durante o regime de apartheid, com o objectivo de levar o governo sul-africano a alterar as suas políticas claramente racistas.
Durante o período de 1974-1977, um outro caso de boicote científico ocorreu contra o International Centre for Theoretical Physics (ICTP) em Trieste, Itália, na sequência da efectiva expulsão deste centro de um dos seus membros: o Estado de Israel. A decisão, neste caso, teve origem nos países do terceiro mundo, como retaliação contra as políticas expansionistas de Israel. Em sinal de repúdio contra aquela expulsão, vários cientistas judeus, americanos e alguns europeus ─ embora poucos ─ recusaram participar em qualquer iniciativa científica do ICTP. É de realçar que o objectivo deste centro ─ financiado pela UNESCO, a International Atomic Energy Agency (IAEA) e o governo italiano ─ era estimular o desenvolvimento científico dos países do terceiro mundo. Este centro apoiava científica e financeiramente os cientistas dos países mais pobres, pondo-os em contacto directo com os seus colegas de países mais desenvolvidos. A participação em conferência, encontros, escolas de Verão e projectos de investigação no ICTP era a forma de criar condições de efectiva cooperação entre cientistas menos e mais favorecidos.
Abdus Salam, prémio Nobel de Física e director do ICTP, não conseguiu convencer os seus colegas dos países ricos a reconsiderarem a sua posição. Por outro lado, estes cientistas esperavam que Abdus Salam, com base no seu prestígio por todos reconhecido, pudesse exercer uma autoridade firme sobre os países anti-semitas de modo a levá-los a alterar a sua decisão política. Este braço de ferro durou três anos, ao fim dos quais a controversa decisão acabou por ser alterada em favor de Israel.
Reconhece-se que o boicote ao ICTP por parte dos referidos cientistas ─ alguns deles de grande prestígio internacional ─ não teve qualquer impacto na decisão final, e que apenas contribuiu para prejudicar as actividades científicas do ICTP durante três anos.
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