A adopção do sistema métrico, como sistema universal de pesos e medidas ─ uma das iniciativas da Revolução Francesa ─ foi extremamente importante para a ciência, indústria e comércio. Não há ainda dois séculos, era enorme a confusão entre os várias medidas que serviam para avaliar grandezas físicas (comprimentos, volumes, massas, etc.), porque os padrões variavam de país para país, de região para região, de cidade para cidade. Toda esta confusão resultava do facto de cada localidade ter desenvolvido os seus próprios padrões desde os tempos remotos em que se iniciaram as primeiras trocas comerciais. Hoje dificilmente poderemos imaginar como seria o nosso mundo sem um sistema unificador e universal como o sistema métrico. São extremamente interessantes os factos históricos relacionados com a adopção deste sistema, mas não é menos interessante a história dos sistemas de pesos e medidas que o precederam.
No Antigo Egipto, a unidade de comprimento era a orgya (1,847220 m), que correspondia à estatura média do homem egípcio, a que se acrescentava 1/8 ou 1 pé (0,205246 m) para se obter o número sagrado 9 (oitavos). Segundo autores do séc. XIX, teriam derivado desta unidade de medida egípcia todas as outras, incluindo as usadas noutras nações. Entre 2500 e 2400 a.C. foram legalmente fixadas na Mesopotâmia unidades de comprimento, peso (ver figura) e capacidade, tendo sido adoptado nessa altura, como unidade de comprimento, o pé de uma estátua de Gudea que foi governador de Lagash, uma cidade dessa região. Várias nações indígenas da América usavam padrões de medida baseados nas dimensões de partes do corpo para pequenos comprimentos, ou dias de viagem para grandes distâncias, tendo algumas delas totalmente desconhecido os pesos e as balanças.
Na Europa, as primeiras tentativas de uniformização de pesos e medidas surgiram durante a Idade Média. Em 1215 estabeleceu-se na Inglaterra a uniformidade de pesos e medidas. Phillipe-Le-Long pensava fazer o mesmo em França quando morreu em 1322, e a mesma intenção tiveram Luís XI, Francisco I, e Luís XIV. Sob o governo de Colbert, realizou-se em França uma reforma dos padrões de medida e organizou-se uma tabela comparativa das várias medidas em uso em todo o país (1683). Porém, este levantamento teve na prática muito pouco impacto…
Em Portugal, foram tentadas algumas medidas de uniformização dos pesos e medidas nos reinados de D. Afonso III e D. Afonso IV com a adopção oficial de determinadas unidades de origem estrangeira, mas que ainda eram variáveis de umas cidades para outras. Nas cortes de Elvas (1361) no reinado de D. Pedro I tomou-se uma decisão de uniformização de pesos e medidas, mas aparentemente sem efeitos práticos. Sá a partir do séc. XVI é que surgiram as primeiras medidas sérias de estandardização.
A reforma de D. Manuel I, na sequência das Ordenações Manuelinas de 1499, conseguiu estabelecer com muito sucesso, a nível nacional, novos padrões de pesos, cujas cópias foram distribuídas por todos os concelhos. No que respeita aos padrões de volume, não se conseguiu estabelecer a desejada uniformização, que apenas viria a ser alcançada no reinado de D. Sebastião. Em 1572, Pedro Nunes foi encarregado por este rei de proceder à reforma dos pesos e medidas e, em 27 de Janeiro de 1575, foi publicada uma lei determinando que em todas as cidades, vilas e lugares, “as medidas de pão, vinho, azeite, & mais cousas que por elas se medem sejam iguais, tamanhas em hum lugar como em outro, sem auer nellas diferença alguma”. O êxito desta reforma foi significativo e talvez se deva à iniciativa de distribuir cópias dos padrões reais por todos os concelhos. No entanto, com o decorrer do tempo o caos instalou-se de novo no País. A avaliação da situação foi iniciada por volta de 1770 pelo cônsul britânico no Porto, John Whitehead, que estudou durante alguns anos os padrões de pesos e medidas usados em Portugal, aferindo e comparando os de vários municípios e construindo novos padrões. O Marquês de Pombal ficou-lhe de tal forma reconhecido que o fez sócio correspondente da Academia de Ciências de Lisboa em 1786. Marino Miguel Franzini (1779-1861) filho do matemático italiano Miguel Franzini ─ que o Marquês de Pombal convidara para Portugal quando da Reforma da Universidade e Coimbra em 1772 ─ organizou uma tabela de pesos e medidas que Adrien Balbi publicou em 1822 com as respectivas equivalências para o sistema francês.
Este sistema francês, isto é, o sistema decimal de pesos e medidas, teve uma história muito interessante que não cabe neste curto relato. Nesta história (ver Histórias da Luz e das Cores ,vol. 2), constata-se que Portugal foi um dos primeiros países a adoptá-lo como sistema único nacional. Em 22 de Dezembro de 1852, um decreto de D. Maria II adoptou-o como oficial, estabelecendo o prazo de dez anos para a sua implantação definitiva e exclusiva. Só em 1859, porém, saiu um “Decreto que manda por em vigor os novos pezos e medidas, pelo systema metrico decimal” mas que se aplicava apenas às medidas de comprimento. Para facilitar o uso dos novos padrões anunciava-se que:
A reforma de D. Manuel I, na sequência das Ordenações Manuelinas de 1499, conseguiu estabelecer com muito sucesso, a nível nacional, novos padrões de pesos, cujas cópias foram distribuídas por todos os concelhos. No que respeita aos padrões de volume, não se conseguiu estabelecer a desejada uniformização, que apenas viria a ser alcançada no reinado de D. Sebastião. Em 1572, Pedro Nunes foi encarregado por este rei de proceder à reforma dos pesos e medidas e, em 27 de Janeiro de 1575, foi publicada uma lei determinando que em todas as cidades, vilas e lugares, “as medidas de pão, vinho, azeite, & mais cousas que por elas se medem sejam iguais, tamanhas em hum lugar como em outro, sem auer nellas diferença alguma”. O êxito desta reforma foi significativo e talvez se deva à iniciativa de distribuir cópias dos padrões reais por todos os concelhos. No entanto, com o decorrer do tempo o caos instalou-se de novo no País. A avaliação da situação foi iniciada por volta de 1770 pelo cônsul britânico no Porto, John Whitehead, que estudou durante alguns anos os padrões de pesos e medidas usados em Portugal, aferindo e comparando os de vários municípios e construindo novos padrões. O Marquês de Pombal ficou-lhe de tal forma reconhecido que o fez sócio correspondente da Academia de Ciências de Lisboa em 1786. Marino Miguel Franzini (1779-1861) filho do matemático italiano Miguel Franzini ─ que o Marquês de Pombal convidara para Portugal quando da Reforma da Universidade e Coimbra em 1772 ─ organizou uma tabela de pesos e medidas que Adrien Balbi publicou em 1822 com as respectivas equivalências para o sistema francês.
Este sistema francês, isto é, o sistema decimal de pesos e medidas, teve uma história muito interessante que não cabe neste curto relato. Nesta história (ver Histórias da Luz e das Cores ,vol. 2), constata-se que Portugal foi um dos primeiros países a adoptá-lo como sistema único nacional. Em 22 de Dezembro de 1852, um decreto de D. Maria II adoptou-o como oficial, estabelecendo o prazo de dez anos para a sua implantação definitiva e exclusiva. Só em 1859, porém, saiu um “Decreto que manda por em vigor os novos pezos e medidas, pelo systema metrico decimal” mas que se aplicava apenas às medidas de comprimento. Para facilitar o uso dos novos padrões anunciava-se que:
A inspecção Geral dos Pezos e Medidas, estabelecida no Ministério das Obras Publicas, fornece medidas de madeira, correntes de latão, e de ferro, a todas as repartições publicas, e aos particulares; que as requisitarem pelos preços de tabella que são os seguintes: Metro cylindro de madeira de carvalho 240 [réis], Dito com virolas de latão 400 […]
Embora com alguma lentidão, o sistema métrico foi-se instalando definitivamente em Portugal. O vereador da Câmara do Porto Francisco José de Araújo, responsável pelo pelouro dos Pesos e Medidas, afirmava em 1882:
O modo suave como se conseguiu introduzir entre nós o systema metrico, grato é dizel-o, honra a todos, povo e authoridades. A authoridade porque foi benevola sem fraqueza, e o povo porque, não obstante o espirito rotineiro que o domina, cedeu sem violencia de habitos inveterados, que herdára de seus avós. Pouco resta, portanto, acrescentar ao que está feito para concluir a reforma dos pesos e medidas, e esse pouco conseguir-se-ha em breve pelos meios adoptados até aqui. O ponto está que a fiscalização não cesse, nem afrouxe. A fiscalização é precisa não só para isso e até então, mas tambem depois para conservar e consolidar um melhoramento que tanto tempo tem levado a implantar, e é de incontestavel vantagem para o commercio.
Nestes assuntos de mudanças radicais, os portugueses nunca foram suficientemente lestos, mas a verdade é que, por razões naturalmente diferentes, os ingleses e os americanos ainda não adoptaram o sistema métrico como sistema legal e único nas suas relações comerciais…
2 comments:
Ola Luis Bernardo
utilisei o seu artigo para illustrar e complementar outro sobre um blog onde apresentava uma medida padrão gravada na fachada dume Igreja de Algodres no concelho de Fornos de Algodres
http://terrasalgodres.blogspot.com/2007/11/medidas-medievais-de-algodres.html
Parabens pelo seu trabalho e divulgação da ciência.
Cumprimentos
Carlos de Matos
Caro Carlos de Matos,
Agradeço a informação e os comentários.
Cumprimentos,
Luís Bernardo
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