A popularidade da ciência tem oscilado ao longo da História devido a factores alheios à sua natureza. De acordo com Abel Salazar (1889-1946), fisiologista, artista e filósofo, possuidor de uma inteligência arguta e de um espírito crítico indomável, o público vê na ciência o “maravilhoso”, que sempre o fascinou: a magia, o esoterismo, o mistério, o sobre-humano, o poder; numa atitude libertadora o público elegeu a ciência como um deus, mais dócil e humano do que o deus da religião, opressor, implacável e inatingível, mas igualmente dogmático.
Na opinião deste fisiologista portuense, uma tal concepção metafísica de ciência ─ totalmente contrária aos seus verdadeiros princípios ─ saiu das “mãos de pensadores de várias categorias, de escritores e vulgarizadores, de universitários e catedráticos”. Com esta acção impulsionadora “a chamada ciência, invertida no seu critério foi insensivelmente transformada em uma nova dogmática”. Esta imagem da ciência iniciou-se no século XVIII, desenvolveu-se no século XIX e perdurou durante as primeiras décadas do século XX. Nas últimas décadas deste período, a ciência foi além disso motivo de disputas ideológicas e políticas que Abel Salazar bem soube exprimir nestas incisivas palavras:
Políticos e sociólogos, literatos e teólogos, repuxam-na em todos os sentidos, cortejam-na, agridem-na, insultam-na ou desprezam-na. Fazem dela escrava dócil e cortesã desprezível; atraem-na para as Direitas e para as Esquerdas, rotulam-na de Proletária ou de Burguesa. Indicam-lhe caminhos sociais a seguir, e fins políticos a desempenhar; põem-na ao serviço de Deus, fulminam-na em nome de Deus.
Desaparecida a aura “misteriosa” que envolvia a Ciência, o público começou de novo a interessar-se pelos temas sobrenaturais, misturando este interesse com o divertimento acéfalo tão característico dos nossos dias.
Sem a atenção generalizada das classes populares, a ciência deixou de ser motivo de disputa ideológica, continuando a merecer apenas a atenção daqueles que realmente a estimavam e que se preocupam com o progresso do conhecimento humano (os cientistas) e dos outros que sempre a tentaram explorar (investidores, militares, gestores e mercadores). Actualmente a situação tornou-se tão opressiva que os primeiros só são tolerados quando servem os interesses dos segundos. Os governos não estimulam a prática desinteressada da ciência ─ um poderoso tónico do intelecto e da virtude ─ e preocupam-se sobretudo com a criação de utensílios que sejam competitivos e que representem elevado valor acrescentado no mercado global.
Ao longo dos tempos, a natureza intrínseca da ciência não mudou, mas os trajes que lhe vestiram afectaram-lhe a imagem. O manto e a cartola de mágico perturbaram-lhe a seriedade e o rigor. A farda militar afectou-lhe a moralidade e, após as bombas de Hiroshima e Nagasaki, levantou-se contra ela a ira popular. Nos nossos dias, o fato de executivo começa a desfigurar-lhe a face ingénua, bela e popular. O amor pela dama engravatada é mais interesseiro e menos apaixonado. Se não se realçar a beleza natural, genuína e despretensiosa da ciência, com as vestes diáfanas e transparentes da cultura, dificilmente ela conseguirá realizar o papel civilizador e universalista que lhe foi determinado pelos seus fundadores.
Abel Salazar criticou a ciência vestida com o manto e a cartola de mágico, mas certamente que não teria gostado ao vê-la engravatada nas feiras industriais dos países do 1º Mundo.
Na opinião deste fisiologista portuense, uma tal concepção metafísica de ciência ─ totalmente contrária aos seus verdadeiros princípios ─ saiu das “mãos de pensadores de várias categorias, de escritores e vulgarizadores, de universitários e catedráticos”. Com esta acção impulsionadora “a chamada ciência, invertida no seu critério foi insensivelmente transformada em uma nova dogmática”. Esta imagem da ciência iniciou-se no século XVIII, desenvolveu-se no século XIX e perdurou durante as primeiras décadas do século XX. Nas últimas décadas deste período, a ciência foi além disso motivo de disputas ideológicas e políticas que Abel Salazar bem soube exprimir nestas incisivas palavras:
Políticos e sociólogos, literatos e teólogos, repuxam-na em todos os sentidos, cortejam-na, agridem-na, insultam-na ou desprezam-na. Fazem dela escrava dócil e cortesã desprezível; atraem-na para as Direitas e para as Esquerdas, rotulam-na de Proletária ou de Burguesa. Indicam-lhe caminhos sociais a seguir, e fins políticos a desempenhar; põem-na ao serviço de Deus, fulminam-na em nome de Deus.
Desaparecida a aura “misteriosa” que envolvia a Ciência, o público começou de novo a interessar-se pelos temas sobrenaturais, misturando este interesse com o divertimento acéfalo tão característico dos nossos dias.
Sem a atenção generalizada das classes populares, a ciência deixou de ser motivo de disputa ideológica, continuando a merecer apenas a atenção daqueles que realmente a estimavam e que se preocupam com o progresso do conhecimento humano (os cientistas) e dos outros que sempre a tentaram explorar (investidores, militares, gestores e mercadores). Actualmente a situação tornou-se tão opressiva que os primeiros só são tolerados quando servem os interesses dos segundos. Os governos não estimulam a prática desinteressada da ciência ─ um poderoso tónico do intelecto e da virtude ─ e preocupam-se sobretudo com a criação de utensílios que sejam competitivos e que representem elevado valor acrescentado no mercado global.
Ao longo dos tempos, a natureza intrínseca da ciência não mudou, mas os trajes que lhe vestiram afectaram-lhe a imagem. O manto e a cartola de mágico perturbaram-lhe a seriedade e o rigor. A farda militar afectou-lhe a moralidade e, após as bombas de Hiroshima e Nagasaki, levantou-se contra ela a ira popular. Nos nossos dias, o fato de executivo começa a desfigurar-lhe a face ingénua, bela e popular. O amor pela dama engravatada é mais interesseiro e menos apaixonado. Se não se realçar a beleza natural, genuína e despretensiosa da ciência, com as vestes diáfanas e transparentes da cultura, dificilmente ela conseguirá realizar o papel civilizador e universalista que lhe foi determinado pelos seus fundadores.
Abel Salazar criticou a ciência vestida com o manto e a cartola de mágico, mas certamente que não teria gostado ao vê-la engravatada nas feiras industriais dos países do 1º Mundo.
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