Tuesday, April 22, 2014

Os economistas da austeridade portugueses desconhecem as potencialidades da ciência

No programa Olhos nos Olhos da TVI 24 de 2ª feira — a quatro dias da comemoração do 40º aniversário do 25 de Abril —  foi confrangedor  ouvir certas afirmações de Medina Carreira, um ilustre representante dos economistas da austeridade, em presença do seu interlocutor Carlos Fiolhais, um cientista convidado para o programa.
Nesta discussão, estiveram em confronto duas concepções de desenvolvimento para um país que Medina Carreira classificou de “pelintra”. Com a desgastada justificação da falta de dinheiro, este austero comentador defendeu que o orçamento do Estado para as Universidades e para a Ciência devia ser reduzido. Carlos Fiolhais argumentou que é por meio da ciência que se poderá fazer o desenvolvimento económico e social do País, e, portanto, o orçamento deveria ser aumentado pelo menos ao nível da média europeia. Argumentou o primeiro que há doutores a mais em Portugal, que não têm emprego e que, portanto, o dinheiro gasto na sua formação tinha sido um desperdício; o segundo contestou, afirmando que, pelo contrário, há doutores a menos e que o conhecimento é o meio de o País se desenvolver.
Está enganado quem pensa que esta discussão é nova e que foi causada pela crise. Em Portugal, houve sempre quem julgasse que a ciência é uma iguaria que não é para a boca — nem é, sequer,  do gosto — dos portugueses, e sempre houve também muitos portugueses ilustres que pensaram o contrário.
Salazar entendia que Portugal se devia contentar com a sua pobreza e acabou por sanear muitos cientistas das universidades portuguesas. Marcelo Caetano encarava a ciência como recurso político, ao afirmar que “no Ministério da Educação Nacional, a investigação científica pode, na ordem das preocupações, ocupar o quarto, o quinto, o sexto lugar; no Ministério das Colónias trata-se de uma preocupação de primeiro plano.”
Há ainda hoje quem não entenda que o atraso nacional se deve à nossa crónica ignorância das letras e das ciências; que a revolução industrial do século XIX não chegou a Portugal por este motivo; que a revolução da informação do século XXI não se fez em Portugal pela mesma razão; que a ciência deve ser encarada como um infraestrutura de desenvolvimento económico e social, como acontece, aliás, em todos os países desenvolvidos. Medina Carreira acha que a ciência não deve ser financiada simplesmente porque não há dinheiro! ... Nesta perspectiva, como estamos cada vez mais pobres, a ciência nacional terá à sua frente um futuro brilhante e, com ela, a vida dos portugueses.
Todos deviam conhecer um bom exemplo histórico vindo da Alemanha — um país que os economistas da austeridade tanto louvam pela política europeia que desenvolve em seu benefício e proveito. Mal terminou a II Guerra Mundial, o governo alemão, com a ajuda dos vencedores — diga-se de passagem — começou a reconstrução do país. Com infraestruturas totalmente destroçadas, uma população pobre e doente, sem homens para trabalhar, qual foi a prioridade para a reconstrução alemã? — O fomento da investigação científica e a reforma das universidades que tão mal tratadas tinham sido durante o regime nazi. O lema adoptado foi “pôr a ciência ao alcance do povo e levar a ciência alemã, depois da derrota, a tornar-se a primeira ciência do mundo.” Em poucos anos a Alemanha adquiriu, pelo menos em parte, o nível de desenvolvimento e bem estar a que o povo aspirava. Actualmente, os alemães são considerados um povo exemplar, têm muitos doutores e até estão dispostos a ajudar Portugal, dando emprego aos engenheiros e doutores que nos sobram.
Senhores governantes, se não são capazes de bem gerir o País, deem ao menos  aos portugueses as ferramentas intelectuais para que possam inovar e progredir. Os que não couberem nesta pequenina terra, neste país “pelintra” da Europa, poderão ao menos contribuir para o progresso das outras nações como a Alemanha.

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